quarta-feira, 16 de maio de 2007

Murmúrios Incessantes

O corredor psiquiátrico afunilava qualquer esperança de fuga… os murmúrios incessantes, martelavam incansáveis a mente ansiosa e adulterada de João. Quero fugir, eles vêm ai - grita horripilantemente… Corrida desmedida, passada insegura, saliva voraz que goteja e se impregna na roupa, visão atroz do futuro. As vozes não deixam escapar ninguém. O enfermeiro observa a situação, João num acto de loucura atira-se a este, vendo nele um dos outros… prisma pervertido da nossa realidade, pois a sua é bem diferente e bem mais sofredora! Os dois caiem, os olhos de João só conseguem contemplar a liberdade para lá do corredor. Agarram-se, debatem-se… realidade contra ilusão, razão contra delírio, eis que João está perto do seu móbil. O enfermeiro em desvantagem tenta conte-lo pela robustez dos braços… mas o medo que se apoderara de João era superior. Os músculos destes dois homens confrontam-se… João consegue desprender-se e precipita-se violentamente contra as grades da janela com o objectivo de alcançar a fuga, uma, duas vezes… o enfermeiro cansado mas esperançado, faz uso do seu mais poderoso recurso, a palavra. Aquela mente possuída pela alienação, incapaz de distinguir aliado de adversário começa a ceder à palavra, à argumentação. João olha para trás, o suor ensopava a farda do enfermeiro, bem como pequenas pinceladas de sangue que escorriam da comissura labial. Este de braços abertos, expressa de uma forma firme mas gentil - não tenhas medo João, vou ajudar-te. Num momento de lucidez, deixa-se cair de joelhos, lágrimas vertem por entre as mãos, gotas que parecem perguntar, porquê, porquê? O enfermeiro avança, estende-lhe a mão e diz - anda, anda dormir!

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